Está na Folha de SP de hoje, matéria da Cláudia Colucci:
O Brasil ganhou sua primeira plataforma on-line que permite a qualquer pessoa cadastrar e armazenar seu testamento vital, documento no qual registra a vontade de recusar procedimentos tidos como inúteis em casos de doenças terminais.
É o caso, por exemplo, de uma reanimação cardíaca em doente terminal de câncer.
Em razão da falta de legislação sobre o tema no país, não existe um padrão de documento, nem definições claras sobre a abrangência ou a forma segura de arquivá-lo.
Foi pensando em tirar dúvidas desse tipo que a advogada e doutora em ciências da saúde Luciana Dadalto decidiu criar, com recursos próprios, o Registro Nacional de Testamento Vital (Rentev).
O banco virtual já conta com 20 testamentos vitais armazenados. "Existe muito tabu sobre a morte, mas as pessoas começam a entender que têm o direito de escolher o que não querem no fim da vida", diz ela, pesquisadora do tema desde 2007.
Luciana afirma que as atuais tecnologias têm possibilitado, cada vez mais, prolongar a sobrevivência das pessoas, mesmo daquelas em processos irreversíveis. "No fim, é um sofrimento inútil."
Para fazer o registro, a pessoa precisa entrar no sistema (testamentovital.com.br) e colocar os dados pessoais. No final, será gerado um código de acesso que a pessoa pode partilhar com algum familiar, médico ou advogado de confiança.
Os primeiros testamentos vitais surgiram nos Estados Unidos, na década de 1960. Atualmente, vários países europeus, como Alemanha, Espanha Portugal e Inglaterra, já reconhecem a validade legal desses documentos.
Em 2012, o CFM (Conselho Federal de Medicina) regulamentou o assunto, dando aos pacientes o direito de definir antecipadamente os limites para a atuação dos médicos.
A resolução do conselho diz que os desejos expressos no documento devem prevalecer, inclusive, sobre a vontade dos familiares.
A exceção ocorre quando as escolhas do paciente afrontam os preceitos da ética médica. A eutanásia, por exemplo, é vetada.
O testamento vital pode ser redigido por qualquer pessoa maior de 18 anos e pode ou não ser registrado em cartório, segundo o CFM.
Saudável e esperando viver até os "cem anos", a enfermeira Ana Cristina Cassoli, 35, conta que já registrou a sua vontade no documento porque não quer que aconteça com ela o que vê nas UTIs dos hospitais. "Dói ver doentes entubados sem nenhuma chance de cura ou de uma melhor qualidade de vida."
Dados do Colégio Notarial do Brasil mostram um número crescente de registros de testamento vital. Em 2009, cinco pessoas registraram o documento em cartório. No ano passado, foram 471.