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quarta-feira, 13 de abril de 2011

CRÔNICA DE AMOR. À Fortitudine 2.8.5




Pelo que me consta, eu sempre arrastei uma asa por essa cidade que hoje festeja 285 anos. Fortaleza, meu amor. A cidade que me acolheu. Ainda menino de calças curtas, lá no sertão das Acopiara, sonhava um dia conhecer-te. Ficar cara a cara, contigo. Matar o verme de tudo que lia e ouvia a teu respeito. E aí te descobri: feminina. Mulher. Mas de uma potência e de uma força incomuns, como convém a teu nome: Fortitudine.

Míope de não fazer inveja a ‘sêo’ ninguém, meu primeiro óculos ajudou a ver melhor tuas formas. Ruas e avenidas de um traçado ainda compromissado com a tranqüilidade dos paralalepídedos; não se sentia o abrasamento do asfalto que, às vezes, te enfeia. Tua paisagem, era ornada de verde que, aos poucos, vai sendo subtraído.

Os da minha idade, certamente, se recordam quando a cidade não respirava o gás de teus automóveis que, hoje, superlotam a cidade e enervam as pessoas. Havia outro cenário. O verde mangueiral, derramava no ar o cheiro da fruta madura que a gente colhia com a mão, fosse onde fosse.

Tinha música própria, o vozerio de tuas ruas. Do amolador esmerilando facas nas esquinas. Do pequeno jornaleiro esgoleando na Ouvidor – “Corrrêi... Poooovo” – e, eu menino véi, besta, recém vindo do interior, achava que fosse alguma boiada em disparada que fosse passar. Passava, sim. Uma multidão de gente apressada. Vinculada a compromissos muitos, como hoje os que se estressam sem nem te olharem cara a cara.

Naquele tempo, tu ensaiavas os primeiros ares de progresso, ajuntando as pessoas nos caminhos suburbanos, que os ônibus despejavam no centro a fim de se entocarem na selva de pedra que já encobria teu céu, onde até o sol mereceu da sua molecagem, uma vaia.

Fortaleza dos anos 60, em que a ditadura militava nas ruas, e nós, os alunos do Liceu em protesto contra qualquer anúncio de aumento das passagens de ônibus – velhas latas que se arrastavam como serpentes vomitando gente a cada parada – éramos o fogo que as mangueiras dos bombeiros mais esguichavam. A praça do Ferreira te assistiu tantos encontros. A atual José de Alencar, desencontrou seus ideais de origem. Virou mercado persa; destemperou-te a calma.

Nas águas de teu verde mar, banhas-te prazeirosa e bela – como a índia acrostada por Alencar da expressão América que deu origem a Iracema. Nos subúrbios, onde se acotovelam os banidos pela seca, sobrevive a alma gentil de teu povo. Simples. Ordeiro. Tranquilo, buscando anatematizar os males de hoje em dia – a falta de educação, saúde e segurança, a permitirem vícios que violentam as almas ainda infantes daqueles que, hoje, tragam outra luz, que não a celebrada por teu pórtico.

Cidade encanto por onde me dirijo todo santo dia. Que, mesmo enquanto mal tratada, saboreia de mim, essa paixão marcada, às vezes, por um sentimento de saudade – como quem olha no retrovisor do tempo para medir a distância do meu tempo - mas não se permite tirar os olhos do futuro que é para onde nos dirigimos. Tu, mais precisamente.

Neste dia de festas, Fortaleza, não te quero apenas bela na logomarca dos que te administram. Nem no olhar curioso dos que estão só de passagem, como os turistas. Eu te quero sempre nossa. Ambientada dessa luz – a da liberdade do teu dragão. E do teu mar, que nunca se perca o verde da esperança de dias melhores para que nós , os cearenses filhos desta terra, possamos viver e morrer sempre de amores por ti.

Texto escrito por Nonato Albuquerque
especialmente para o Jangadeiroonline

5 comentários:

Ismael Luiz disse...

Nonato,parabéns pelo belo texto.Não poderia ser diferente.Embora não tenha vivido os anos 60,como você os cita,tive a grata alegria de,nos anos 80,aportar nesta bela cidade,a princípio,como uma passageira presença,logo transformada em algo eterno,quando vislumbrei o belo sol,o verde do mar que banha nosso corpo,além da hospitalidade do fortalezense que,como bom cearense,esbanja simpatia e a gostosa e tradicional molecagem.Vinte e nove anos se passaram e,embora morando,hoje,vizinho à bela capital,não me canso de admirá-la,mesmo com os tristes atos de violência,não vividos nos belos anos de minha chegada.Quando minha família me chama de volta ao torrão natal, fico imaginando como seria a minha vida longe do Ceará,na certa,um caos.

Anônimo disse...

Belíssima crônica. Foi uma apresentação da cidade como ela merece ser apresentada. Parabéns.
PROFDJACYR
Coloquei no meu blog caosnaeducacao.blogspot.com

Anônimo disse...

Linda homenagem Nonato! Fortaleza merece. Bjus Morgana Kátia

Celina Corte Pinheiro disse...

A primeira vez que entro neste blog! Gostei da crônica sobre Fortaleza. Se tiver tempo e vontade, saiu hj um texto meu no DN (14/04) que fala sobre o questionável progresso de Fortaleza e dá aquela receita de praça que ainda não saiu de moda. Tudo o mais é invenção que não dá em nada. Abração.
Celina

Anônimo disse...

Nonato, um dia quero poder morar nesta terra tão linda de povo tão hospitaleiro que me fez ficar emocionado...quando aí estive numas férias há uns 03 anos antes.

Lê sua homenagem é trazer na lembrança velhos tempos quando de férias, na mocidade, ia pra casa de meus avós que aí moravam na praia do Meireles...

Gosto muito do seu Blog, da forma pura de sua escrita,da forma centrada, coerente e magnetizadora que você reflete em seus escritos.
Parabéns Fortaleza por ter um filho
que te ama e te desfralda em vibrações de amor, luz te eternizando como a uma mãe infinitamente pura e bela.

Parabéns Nonato.
Muita luz e paz em seu caminho.
J.Figueire